É que quando chega às 3h37 e do sono nem sinal, fico pensando no infinito da madrugada enquanto o teto cobre a tua cabeça e a minha. E ainda em como é o teu teto; se paisagem para a insônia, se só como se fosse o cobertor de veludo para alguns sonhos & outras anas na cama. Mas tanto faz. Mas tanto teto faz com que eu fique assim, pensando tanto no teto. Talvez seja o medo de domingo, mais pavor do que fobia. Ou não. Talvez eu minta. Acho que a madrugada rouba a boca, o nariz, os olhos dos rostos para a singularidade ficar sem tato. Nem teto. Ou nem tanto.
Num plano transitório, a dimensão das coisas não-físicas vai tomando o vazio espacial à proporção que o tempo diminui e, então, a madrugada torna o ser um gerúndio. Um sendo branco esclerótico & polinômio, embora carente de características. E que anda, caminha lento de uma esquina a outra pelo quarto, atravessa a janela permanecendo estátua de gente nenhuma & sem data na linha do tempo dos livros de história, e que dedilha estrofes de poesia ao passo que as entonações das entrelinhas apenas são permitidas dentro do branco esclerótico & polinômio pois, lembre-se, não se tem mesmo boca. E porque é madrugada. Tudo tão perigoso e muito mais cruel. E agora cabe a fobia, por ser o medo mórbido sobre algo específico.
Nada no tudo do mundo é tão específico quanto a madrugada, a tal noite alta num silêncio-violino. Quando não é assim - alta madrugada violino noite silêncio -, a vida tira o pijama, troca o vestuário, escova os dentes, pega o ônibus, vai à faculdade, lê Jung, Freud, Psicologia Social, entra no ônibus mais uma vez, passa na farmácia, depois no bar, chega em casa, ouve blues, toma banho, lava a roupa e a louça, dobra e passa a roupa etc.; a vida vive sem quase reparar no relógio. Aí - não num repente mas é sentido como se assim de fato fosse -, o plano transitório & os olhos, boca e nariz fora da órbita usual. Do ser, um sendo. E, a partir do que foi aludido, por exemplo, o ânimo enigmático para a dimensão física do teto que acaba por tirar de cena qualquer ciência incontestável. É na madrugada que se duvida e que a vida toma partido sobre o que marcam os ponteiros. A crueldade ganha a intensidade do superlativo com o seu próprio radical somente no silêncio-violino, podendo, então, ser a crueldade cada vez mais cruel na medida em que o plano transita. 3h37 pode ser fatal na sua infinitude. Atrofiem os ponteiros para que não haja a dança, somente a música do violino sem cordas, sem arco nem mãos. Sem tato, portanto.