quarta-feira, dezembro 31, 2008

Toma os teus ponteiros

Que esse ar que me falta
é o troco dos relógios que invento.
2008, de fato, foi o ano da lama.
Todavia, que venha o vinho,
mais chuva no ninho,
&, por favor, meus corações todos num só umbigo.

quarta-feira, dezembro 10, 2008

Hoje é dia de Clarice, 10 de dezembro de 1920

''Era noite cada vez mais escura e chovia muito. Embora sem vê-lo, reconheceu pela sua respiração pausada que ele dormia. Ficou de olhos abertos no escuro e cada vez mais o escuro se revelava a ela como um denso prazer compacto, quase irreconhecível como prazer, se fosse comparado com o que tivera com Ulisses. Ele estar dormindo ao seu lado deixava-a a um tempo sozinha e integrada. Ela não queria nada senão aquilo mesmo que lhe acontecia: ser uma mulher no escuro ao lado de um homem que dormia.''
(Página 148, Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres - Clarice Lispector)

Pneumotórax

''Febre, hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
— Diga trinta e três.
— Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
— Respire.
.............................................................................
— O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.''
(Pneumotórax in Libertinagem - Manoel Bandeira)

terça-feira, dezembro 09, 2008

Birds of Paradise

No substituto de outro instante - nessa de mundo numa festa à fantasia, astronautas reagindo à fotoquímica, corações emergindo em escafandros, almas a ver navios piratas -, quando tua mão resolver-se à minha, a paisagem bordará, apenas, uma risada malévola de um Deus.
Do pó, o que o vento não levou. De mim, o sono repetindo as vinte e quatro horas. De ti, a imbecilidade subindo palanques. De nós, as amarras desatadas.

segunda-feira, dezembro 08, 2008

Conteúdo fônico descomplicado p'ro Benzinho

Bota as roupas p’ra lavar, Neguim, sei que tem xícara com café monco esquecida embaixo da cama, tá ouvindo não que o cinzeiro grita o hino por paz? Ó o lixinho atrás da porta, Benhê! Encontrei o Montilla na tua gaveta de cuecas & samba-canções, amor beldo de beldade atrofiada, olhaí o paletó servindo de tapete p’r’esse vira-lata!
Seo Francisco Raimundo, desde quando eu falo grego p’ra’s paredes dessa casa? Vou arredar o pé diss’aqui se em dois palitos não fizer das tripas coração!
Devolva o sorriso p’ra’s minhas rugas, meu Chico, ’que aí nem penso e a gente já cai p'ro suor, fazendo graça no sofá da sala..!
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(O que é que teu ouvido de tuberculoso quer? Não sei a quantas anda a lógica do dia seguinte, então toma o silêncio da minha língua.)
  • ata-me, ata-me, ata-me, ata-me, ata-me, ata-me,,,
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