sexta-feira, agosto 01, 2008

A idade da razão

''Mathieu não escutou mais, sentia-se envergonhado diante daquela imagem de dor. Era apenas uma imagem, bem o sabia, mas assim mesmo...´Não sei sofrer, nunca sofro o bastante.` O que havia de mais penoso no sofrimento era que se tratava de um fantasma, a gente passava o tempo a correr atrás dele, imaginava sempre que ia alcançá-lo, que se ia jogar dentro dele e sofrer de verdade rangendo os dentes, mas no momento em que pensava atingi-lo ele escapava, a gente não encontrava mais nada senão um fogo de artifício de palavras e milhares de raciocínios desvairados em minuciosa efervescência. ´Essa tagarelice na minha cabeça, eu daria tudo para conseguir me calar.` Olhou Bóris com inveja. Aliás, naquela fronte obstinada devia haver enormes silêncios. ´Minto`. Sua decadência, suas lamentações eram mentiras, vazio, ele se empurrava para o vazio, à superfície de si mesmo, para fugir à pressão insustentável de seu mundo verdadeiro. Um mundo negro e terrível que fedia a éter.''
Página 233, A idade da razão - Jean-Paul Sartre.